terça-feira, junho 20, 2006

I see your face before me


Afaga-me. Passa-me as mãos pelo rosto, descobre os meus altos e baixos, quero ter-te no escuro, cegos ambos, a ver-me através dos teus dedos. Não acendas a luz, não é preciso, amor, nunca precisei de te ver com clareza para saber de cor o desenho do teu corpo, e sempre encontrei o meu tesouro nos teus segredos, sempre soube como eras, de que formas és feita. Não acendas a luz. Afaga-me com ternura, devagar, sabes que este amor só o podes viver em slow motion, e ao contrário dos teus dias, quero que as noites sejam feitas de vagar, quero que me descubras até me saberes de cor, de olhos fechados.

Lembras-te das Pontes de Madison County? Nunca entendeste que aquela história é a nossa história, que a dança ao som da música do Johnny Hartman é a nossa dança, e que vivemos todos os dias sem saber o que esperar, sem saber que partimos para regiões desconhecidas. Acalenta-me, diz-me que toda a nossa vida vai ser um romance impossível como o dos filmes, e que te vou perder tantas vezes como te vou reaver, porque não acredito em amores seguros, tenho que saber o que é estar sem ti, e deixar que a dor me acaricie o peito, para melhor te saborear na noite seguinte.

Toco-te com dedos interrogativos, na cegueira do negrume, e vejo a tua face, e sei que és o meu único sonho, não há nada mais do que a tua face nos meus dedos, e nada mais do que o meu sonho nesta cama. Estamos os dois no meio dos lençóis suados, e só consigo ouvir a tua respiração entrecortada, se fosse surdo nem saberia que estás aqui, parece que sonho, que estou sozinho a lutar para não acordar, a imaginar uma pessoa que não existe. Já sonhei tantas vezes contigo, nem imaginas o que é isso, ter-te ao meu lado e ser surdo e cego, não te ouvir a respirar, agora que já aqui estás, deixa-me voltar a ser só, para ler o teu rosto no toque dos dedos, e acordar do sonho de solidão.

Não acendas a luz, e não me perguntes nada. O dia já tem demasiados porquês, quero que a noite seja uma pergunta sem resposta, um desconhecimento dos sentimentos, a incógnita do carinho. Entra-me como eu entro em ti, penetra-me com o medo do explorador incauto, como eu adentro o teu intimo húmido, sem mapa, não digas nada e não acendas a luz, toca-me e olha-me nos olhos cegos, afaga-me.

Fecha os olhos, afaga-me.

4 comentários:

Patrícia disse...

coincidências curiosas... a música que se ouve, o nome de um blog interessante, as vivências... :)

Sandman disse...

Não conhecia a música "Passenger", apenas a versão no plural do Iggy (que não deu o nome ao blog), pelo que fiquei curioso, quando postaste a letra...

E gostei, quando a ouvi. :-)

Patrícia disse...

Que bom! :) Adoro a música...

Eu "mostrei-te" algo, agora mostra-me tu: porquê Sandman? Quem é?

Anónimo disse...

ler todo o blog, muito bom